Por Vitor Nuzzi, da RBA
São Bernardo do Campo (SP) – O cantor e compositor Caetano Veloso deixou a
Ocupação Povo Sem Medo, em São Bernardo do Campo, no ABC paulista, às 20h45
desta segunda-feira (30), sem conseguir realizar o show anunciado pelo Movimento
dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). O motivo foi decisão da juíza Ida Inês Del Cid, da 2ª Vara da Fazenda Pública de São
Bernardo.
Dizendo não ser "técnico" em questões legais, Caetano afirmou se sentir mal
com a proibição. “Dá a impressão de que não é um ambiente propriamente
democrático”, declarou o compositor ao sair da ocupação. “É a primeira vez que
sou impedido de cantar no período democrático”, disse ainda. Para o cantor, "uma
área urbana não pode ficar sem função social".
Para o coordenador do MTST, Guilherme Boulos, a Justiça deveria se preocupar
em “pegar a quadrilha que está no poder no Brasil", em vez de proibir uma
apresentação musical. “Hoje aqui em São Bernardo mais uma vez a Constituição
brasileira foi rasgada. É um absurdo, é censura, é ilegal. Para muita gente
dentro do Judiciário o preconceito vale mais do que a lei. Se eles queriam nos
provocar para uma ação violenta não conseguiram. Isso nos dá energia, nos dá
ânimo”, afirmou, acrescentando que a "resposta" do movimento será dada nesta
terça (31), com marcha logo cedo até o Palácio dos Bandeirantes, em São Paulo,
sede do governo estadual. "Uma das maiores marchas dos últimos anos",
adiantou.
Boulos também criticou o prefeito de São Bernardo, Orlando Morando (PSDB),
que segundo o coordenador do MTST apostou no conflito. “Eu não sei o que ele tem
na cabeça. Ele age com ranço, com preconceito.” Ele questionou a alegação de
falta de segurança. Com 8 mil famílias, segundo o movimento, a ocupação começou
há quase dois meses, sem registro de incidentes.
Com a proibição judicial, os artistas que foram à ocupação participaram de um
ato em um pequeno palanque, em uma área mais elevada, perto do barraco da
coordenação. Passaram o dia no local as atrizes Sônia Braga, Letícia Sabatella,
e Alinne Moraes, além da cineasta e apresentadora Marina Person. Elas também
foram à prefeitura e ao Ministério Público tentar a liberação do show.
"A luta de vocês é completamente legítima. E ela tem de continuar", disse
Marina. "Vocês são exemplo para nós", afirmou Letícia, falando em "esperança,
alegria, riqueza, cultura". "Muito obrigado por nos ensinarem."
"Amanhã, amanhã"
Acompanhado da produtora Paula Lavigne, sua mulher, e do cantor Criolo,
Caetano chegou mais tarde, 20 minutos antes das 19h, horário marcado para o show
que acabou não acontecendo. Naquele momento, havia ainda expectativa de que a
apresentação fosse realizada. Por volta de 19h15, o deputado estadual Marcelo
Freixo (Psol-RJ) saiu para conversar com jornalistas e informou que a liminar
seria respeitada. Mas criticou: "As pessoas que tomaram essa decisão sequer
tiveram a preocupação de olhar o lugar". Ele disse estranhar também que a
imprensa soubesse da proibição antes dos organizadores.
Minutos depois, Boulos, Caetano e artistas subiam alguns metros em direção ao
palanque. Ao microfone, o coordenador do MTST confirmou, então, que não haveria
mais show. "Talvez com isso eles pretendessem que a gente reagisse no mesmo
nível e fosse para a agressão com a Guarda Civil ali na frente", afirmou,
criticando a prefeitura, o Judiciário e o Ministério Público. O público começou
a gritar "Amanhã, amanhã". Boulos passou a palavra a Paula Lavigne, que pediu
desculpas pelo cancelamento e usou tom conciliador.
"Não estamos aqui para fazer guerra, estamos aqui em missão de paz. A única
coisa que eu prometo é que a gente vai fazer esse show", garantiu. "Estamos
aqui, estamos juntos", prosseguiu Caetano. "Eu já entendi que esta força aqui é
o que nos move e nos vai fazer continuar a lutar", disse Alinne, enquanto a
multidão cantava "pisa ligeiro, pisa ligeiro, quem não pode com a formiga não
atiça o formigueiro".
O ato terminou por volta de 20h, com gritos de "Fora Temer" e "Fora Orlando".
Sobre o ato desta terça-feira (31), que sairá de São Bernardo às 6h, Boulos
disse que o objetivo é comprar do governo a desapropriação da área em São
Bernardo, entre outros compromissos. Da mesma forma, ele espera resultados na
reunião marcada para 11 de dezembro, para discutir a ocupação. "Esperamos que
quem for chamado para aquela mesa vá com propostas."
Comentários
Postar um comentário