Poderia ser mais um fato isolado,
resultado do cotidiano estressante da carreira dos policiais que atuam
em São Paulo. Mas não é só isso. A história do delegado de 49 anos que
apanhou de policiais militares da Rota na última quinta-feira, em Rio
Claro, no interior de São Paulo, revela a profundidade da crise
estrutural de nossas polícias e a necessidade de reformas. As promessas
de aproximação entre as corporações são antigas, tem quase 40 anos,
mas policiais militares e civis ainda agem como se fossem rivais.
Eram
19 horas da última quinta-feira quando PMs da Rota chegaram à delegacia
em Rio Claro levando um suspeito que eles acreditavam ser procurado
pela Justiça. O delegado fez a pesquisa no sistema e viu que os PMs
estavam enganados. Um mandado havia sido expedido em junho e foi
cumprido dois meses depois. Não havia nenhum novo pedido na Justiça, o
que significava que o suspeito não podia ser preso. Era o motivo para o
clima começar a esquentar na sala do plantão. O soldado da Rota insistiu
e disse que o sistema havia se enganado. O delgado mostrou os dados ao
policial, que não se deu por satisfeito.
O tenente da Rota que
acompanhava a cena ao lado começou a rir e a debochar do delegado, que
perguntou o motivo das risadas. Ouviu em resposta: “Aqui é Rota e aí é
bandido. Água e óleo não se misturam”. Ao mesmo tempo, o tenente apontou
uma pistola ponto 40 para o delegado. Advogados e cidadãos que
estavam na delegacia acompanharam o barraco. O oficial disse ainda que o
delegado era um “bost..” e saiu junto com seus comandados para a
varanda da delegacia.
O delegado foi atrás dos PMs para se
certificar do nome dos que o agrediam. O tenente fez menção de esfregar
seu uniforme na cara do delegado. Em seguida, empurrou o delegado com as
duas mãos contra seu peito. O óculos do delegado caiu no chão. Nesse
momento, os outros policiais pisaram nos óculos, que quebrou. Alguns
advogados no plantão chegaram a filmar a cena com celulares, mas
também foram ameaçados pelos PMs. Apesar de agredido, o delegado diz que
não deu voz de prisão aos militares por causa das ameaças e pressões
que sofreu. O delegado registrou o boletim de ocorrência
Os PMs
não tiravam essa ideia da estratosfera, mas da realidade observada nas
ruas. Não era à toa a desconfiança junto aos delegados.
A briga
entre Rota e delegado foi só a explosão de um sintoma do problema. Não é
à toa que permanece caótica a capacidade do Estado em punir aqueles que
praticam crimes graves. E não é por menos que os roubos seguem em
ascensão contínua, como mostram mensalmente os dados oficiais do Governo
de SP.
A reforma das Polícias e temas relacionados à segurança
pública é um tema que este ano devem fazer parte dos debates para
presidente. Os três últimos presidentes se omitiram temendo prejuízos
políticos que o assunto poderia trazer aos seus mandatos. Não é mais
possível se omitir.
Por Bruno Paes Manso, economista e jornalista
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