Por Delfim Netto – Economista, ex-ministro e ex-deputado federal (texto
originalmente publicado na Revista Carta Capital - www.cartacapital.com.br)
O Brasil vive hoje uma revolução econômica e ao mesmo tempo uma
revolução demográfica, não muito comentada. Da econômica todos falam, bem ou
mal: se crescemos menos de 1% de um trimestre a outro, o tema vira manchete na
imprensa (escrita ou virtual). E só é substituído quando se “revela” que, por
causa do baixo crescimento em 2012, a Inglaterra retomou a posição de sexta
economia mundial, nossa por uns poucos meses…
Na revolução demográfica há sinais tão importantes quanto na outra, que
nos ajudariam a pensar o Brasil que gostaríamos de legar para a geração a
amadurecer em 2030. São fatos já inscritos que com toda a probabilidade se
realizarão, a não ser que sejamos atropelados por uma improvável invasão
marciana.
Essa revolução deve-se basicamente ao processo civilizatório felizmente
alcançado pela mulher brasileira, que hoje estuda mais, gera menos filhos (e um
pouco mais tarde) e aumenta sua participação na força de trabalho. Há menos de
quatro décadas temia-se que o Brasil, com sua então fantástica taxa de
fecundidade, estaria condenado a ser um país miserável.
É preciso fazer justiça a alguns economistas e aos demógrafos mais
recatados, que nunca aceitaram o propalado crescimento exponencial. Seus
modelos eram pouco sofisticados. Implicavam na aceitação de uma função
logística com assíntotas precariamente determinadas. De qualquer forma, a
situação parecia mesmo muito preocupante. Na década de 1960, a média de filhos
por mulher era de 6,3! Não foi, sem alguma razão, que naquele momento o Brasil
namorou um processo de “controle da natalidade”, com forte e organizada
oposição da Igreja Católica. Foi o processo civilizatório da mulher brasileira
que finalmente reduziu em menos de duas gerações a sua taxa de fecundidade para
1,94, ligeiramente abaixo da taxa de reposição populacional de 2,1 filhos.
Qual o seu resultado? Segundo o Censo de 2010, a população brasileira era de 191 milhões,
praticamente 65% do propalado terrorismo demográfico de 1960! O Brasil é hoje
um país com pequeno crescimento populacional e aumento significativo da
expectativa de vida ao nascer. Vamos passar por um máximo populacional em 2040,
acompanhado de um envelhecimento significativo. O aumento da população não será
apenas quantitativo, mas também e principalmente qualitativo, com uma mudança
profunda na estrutura da demanda de bens e serviços.
Esse fato demográfico insuperável coloca o mais importante problema que
temos de deixar solucionado para a próxima geração. Hoje temos pouco mais de
130 milhões de pessoas entre 15 e 64 anos. Em 2030, teremos 150 milhões:
cidadãos mais velhos, mais educados e, tudo sugere, mais exigentes em relação à
administração do País.
O mais importante problema nacional é este: como vamos organizar a
sociedade brasileira para propiciar empregos de boa qualidade e salários
adequados a 150 milhões de pessoas, a população em idade ativa em 2030? A
resposta não é simples nem clara.
O que é simples e claro é que isso não se fará simplesmente aprofundando
a estrutura produtiva atual, apoiada na sofisticadíssima e produtiva
agroindústria nacional, de maior valor agregado do que em geral se quer
admitir, mas poupadora de mão de obra. E muito menos com a exploração mineral
(inclusive o petróleo), atividades altamente intensivas em capital, com
altíssima tecnologia e trabalho superespecializado.
Caso queiramos ter em 2030
algo parecido ao nível de renda per capita em paridade de poder de compra de
Portugal de hoje, temos de crescer em torno de 5% ao ano (mais ou menos 4% do
PIB per capita) em média nos próximos 18 anos. Pedirá uma cuidadosa e rigorosa
política fiscal capaz de sustentar a política monetária (que produzirá o
equilíbrio interno) e uma adequada política cambial (que produzirá o equilíbrio
externo).
Isso exigirá um investimento bruto anual até 2030 da ordem de 25% do PIB
(com talvez um déficit em conta corrente de não mais que 1,5% ao ano). O nosso
Estado forte, constitucionalmente controlado, precisa cooptar, com regulação
segura e amigável, o nosso eficiente setor privado! É preciso superar a
desconfiança mútua, ainda existente entre eles, com a transferência por
concessão ou parcerias do investimento em infraestrutura para o setor privado,
por meio de leilões bem projetados que determinem as justas taxas de retorno
para garantir a quantidade e a qualidade dos serviços no presente e no futuro.
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