Jairo Saddi (Valor, 25/09/17) informa que 144 milhões CPFs de clientes ativos
da população brasileira [90,4% face a 159,3 milhões de pessoas
com mais de 15 anos], segundo a Pesquisa FEBRABAN-Delloite de Tecnologia Bancária 2017, mantêm algum tipo de
relacionamento bancário. A isto se dá o nome de “bancarização“,
ou inclusão bancária. Apenas para efeito de comparação, em 2008 o grau
de bancarização era de 72,4% e menos da metade disto em
1990. Contudo, o número que impressiona não é esse. Segundo a mesma
pesquisa, 57% do volume total de transações bancárias se dá por meio do celular
ou da internet, respectivamente, “mobile banking” ou “internet banking”
– e isso vem crescendo a cada ano.
No entanto, um olhar um pouco mais atento aos números mostra que, enquanto
cresce o número de cidadãos que passam a ter algum relacionamento bancário — e
em pouco tempo, graças à tecnologia, 100% dos brasileiros estarão bancarizados —
esta bancarização ainda é frágil, superficial e pouco abrangente.
Segundo a leitura de Saddi dos dados do Sistema de Informações de Crédito do
Banco Central, o SCR, do total da população bancarizada somente 34% têm
algum relacionamento de crédito e menos de 40% utilizam suas contas
bancárias para algo além do recebimento mensal de salários e remunerações fixas
como pensão etc.
[Fernando Nogueira da Costa: os “big five” (BBICS) somavam
90.142.426 clientes de crédito em março de 2017, ou seja, 71% do total do SFN
(126.374.203), segundo minha pesquisa no SCR, portanto, esse último número
representaria sim 88% dos CPFs.]
Vale dizer, serviços financeiros ainda estão inacessíveis para a maior parte
dos bancarizados. No dizer de David Brear, citado na matéria da “The
Economist” (09/09/2017, pág. 57), “inclusão não significa engajamento”. E o
movimento das fintechs, segundo o mesmo artigo, vem impulsionando a vanguarda no
topo da pirâmide social, enquanto as telecoms e os provedores da internet o
fizeram melhor na base.
De fato, quando se pensa em bancarização, é preciso dividir
a indústria financeira em algumas áreas de serviços, dentre as quais o
crédito é apenas uma; há ainda os meios de pagamento, investimentos e gestão
de recursos, seguros e, é claro, serviços de conta corrente e câmbio. E
cada uma dessas áreas pode ter inúmeras subdivisões, por exemplo:
- o crédito pode ter serviços de empréstimos, de renegociação de dívidas, de crowdfunding;
- os meios de pagamento podem abarcar blockchain e criptomoedas, como bitcoins, e
- a gestão de recursos vai dos investimentos à eficiência financeira.
Seguros, ainda que não sejam um serviço financeiro puro, compõem um mundo
inteiramente à parte. Enfim, é fácil perceber que estamos diante de um universo
complexo, multifacetado e extremamente promissor quanto à oferta de produtos e
soluções.
O que ocorre, para os bancarizados em geral, é que tal oferta ainda é
muito limitada. Há razões expressas e explícitas para isso:
- problemas com a documentação exigida,
- falta de histórico de crédito e impedimentos para constituição de garantias,
- incapacidade de manter saldos bancários mínimos para operar,
- altas taxas cobradas,
- e também uma certa desconfiança dos bancos.
A questão-chave é: para PF tomar crédito é positivo? Para financiar
consumo com os disparatados juros brasileiros de empréstimos?! Não, apenas vale
para financiar a aquisição de moradia em longo prazo. É mais prudente receber
juros, acumular capital e comprar à vista.
Assim, a maior parte da população faz parte apenas do sistema de
pagamentos eletrônicos. Há apenas 10,426 milhões de investidores em fundos
e títulos e valores mobiliários, além de 60,5 milhões de contas de poupança com
saldo acima de R$ 100 e saldo médio de R$ 10.650, totalizando R$ 644
bilhões.

Nathália Larghi (Valor, 25/09/17) informa que o aumento do uso de plataformas
digitais para transações bancárias e a popularização dos terminais
compartilhados, além do custo de manutenção e questões de segurança, estão
levando ao encolhimento daquele que já era um dos principais canais de operações
até pouco tempo: os caixas eletrônicos dos bancos (ou ATM,
sigla de “Automatic Teller
Machine“).
No primeiro semestre de 2017, o número de caixas eletrônicos próprios dos
bancos Itaú, Banco do Brasil e Santander registrou queda em relação ao mesmo
período do ano passado. O Itaú tirou 814 máquinas de circulação; no Banco do
Brasil, 4.539 equipamentos deixaram de ser usados; e, no Santander, a redução
foi de 517 caixas.
Dentre os cinco maiores bancos do país, o único que registrou aumento nos
primeiros seis meses de 2017 foi o Bradesco, mas, segundo o banco, isso ocorreu
por conta da incorporação dos caixas do HSBC e da instalação de novos
equipamentos em agências em que o banco identificou uma demanda maior por
operações nesse canal. Na Caixa Econômica Federal, que ainda não divulgou o
balanço do segundo trimestre, o número de terminais vem caindo desde 2015 em
linha com o mercado.
Segundo dados do Banco Central, os últimos disponíveis, 2016 acabou com 6.431
terminais a menos, para 175.947 postos. O movimento de redução
começou em 2015, com 2.068 ATMs saindo de circulação, totalizando no fim daquele
ano 182.378 máquinas, no que foi a primeira baixa desde 2008, início do
levantamento do BC.
Por outro lado, os caixas eletrônicos do Banco24Horas, que executam
transações de várias instituições em um mesmo equipamento, tiveram um
crescimento de 10% no primeiro semestre do ano, com aumento de 1.874 pontos.
Operadas pela empresa TecBan, essas máquinas – que permitem ao correntista fazer
transações básicas, como saques e transferências – têm substituído equipamentos
dos bancos principalmente em locais públicos.
Com a digitalização cada vez maior dos serviços bancários, que passaram a
ser realizados via celular e internet banking, os caixas eletrônicos vão
perdendo apelo. A principal função, segundo especialistas, acaba sendo
o saque. Mesmo assim, dados do BC mostram que a retirada de
dinheiro nesses terminais caiu 5% no último ano, primeira queda desde 2008.
As pessoas vão ao ATM para sacar dinheiro. E com a digitalização dos bancos,
os pagamentos tendem a ser virtuais e o caixa acaba ficando menos necessário.
Então, ele pode cair em desuso. A redução do número de terminais também está
ligada a questões de segurança e corte de custos.
Segundo especialistas, os gastos para instalar e manter um caixa eletrônico
próprio são muito altos, já que além da manutenção do serviço também é preciso
contratar empresas de segurança para abastecê-los. O custo mensal de
manutenção dos ATMs externos (fora da agência) gira em torno de R$ 20 mil. Já o
preço do terminal é de cerca de R$ 30 mil.
O compartilhamento então surge como uma forma de cortar
despesas. Como são compartilhados, os gastos são divididos e uma só empresa fica
responsável por ele, o que costuma ser mais eficiente.
Diminuir o número de caixas não é uma política adotada unicamente devido à
segurança. É um tema importante no Brasil. Realmente é o único país do Santander
que acontece de explodirem agência, caixa. O que tenta fazer é orientar o
cliente a usar app, internet banking, mas não especificamente fala de segurança
pública.
Uma evidência da importância da segurança no Brasil é a orientação do
Banco Central e da Febraban para que os bancos coloquem limites para o valor
sacado nos caixas após as 22h.
No caso dos caixas do Banco24Horas, as instituições financeiras pagam um
valor mensal para a TecBan, que é contratada como se fosse um serviço
terceirizado. Essa “mensalidade” acaba sendo mais baixa do que os gastos que uma
instituição teria para manter sozinha determinada quantidade de caixas
eletrônicos. Além disso, as instituições ainda podem cobrar tarifas dos clientes
pelo uso desses terminais compartilhados, o que acabaria suprindo parte desse
gasto. Entre os acionistas da TecBan, estão os maiores bancos do país.
A tendência é que o correntista seja cada vez mais um “cliente do sistema
bancário” e não de uma instituição específica. A ideia é que o sistema
bancário migre para um nível de cooperação maior, como as redes de
pagamento. O Banco Central começou a fazer pressão em cima disso com as
redes de POS, com o fim do arranjo fechado, e isso também está acontecendo nos
ATMs. É uma tendência, faz parte de uma lógica para tornar o sistema inteiro
mais eficiente.
Em nota, a TecBan afirma que “a tarifação é definida
exclusivamente por cada instituição” e que “a maioria dos bancos igualou as
regras do uso do Banco24Horas às da sua rede”, o que significa que o pacote de
serviços contratado por aquele correntista pode ser usado em qualquer um dos
dois canais e só será cobrada uma taxa adicional caso o cliente exceda o que lhe
é oferecido mensalmente, independentemente dos caixas que tenham sido
usados.
Há utilização cada vez menor do papel moeda, mas a parceria com a TecBan
serve para suprir as necessidades dos clientes. Na visão do cliente, com esse
acordo de compartilhamento o número de postos para operações cresceu no primeiro
semestre. Busca-se otimizar o serviço, com os caixas da TecBan em lugares
estratégicos. Não tem uma direção de acabar ou diminuir com esse serviço, porque
na economia brasileira, embora esteja diminuindo, ainda existe o uso de papel
moeda [“Geddeis”], que é a principal finalidade dos caixas.
O Banco do Brasil afirma em nota que “os terminais do Banco24Horas estão
substituindo terminais de grandes bancos em vários locais”, o que “gera maior
eficiência operacional e permite que clientes de várias instituições financeiras
tenham acesso à realização de transações”. O banco ainda frisou que os hábitos
dos correntistas também mudaram, com foco cada vez maior em canais digitais e
“sensível redução do uso de outros canais, como os terminais de
autoatendimento”.
Também em nota, a Febraban diz que “o parque de equipamentos [ATMs]
instalados vem passando por um movimento de consolidação do mercado, com a
adoção de terminais cada vez mais multifuncionais – aqueles que permitem a
realização de várias funções num mesmo equipamento – e em conformidade com
normas de acessibilidade”.
A entidade afirma ainda que, de acordo com sua mais recente pesquisa sobre
tecnologias bancárias, os correntistas mantiveram a mesma regularidade de
uso dos caixas eletrônicos nos últimos dois anos, com dez bilhões de
transações tanto em 2016 quanto em 2015, o que representa 16% do total de 65
bilhões de operações feitas no ano passado.
A Febraban ressalta, no entanto, que o canal preferido dos brasileiros é
o mobile banking, responsável por 21,9 bilhões das transações realizadas em 2016
– quase o dobro do montante registrado em 2015. Internet Banking e Mobile
Banking (IB/MB) representam 76% do volume das transações por canais sem
movimentação financeira. A participação de agências, ATMs,
correspondentes bancários e Contact Center em movimentação financeira é ainda
mais da metade: 51%; POS fica com 29% e IB/MB com 20%.
Newley Purnell (Valor, 25/09/17) informa que o Vale do Silício é a sede das
empresas de tecnologia mais influentes do mundo focadas no consumidor, mas
os titãs de internet chineses estão muito à frente na corrida para criar
serviços de pagamentos móveis em muitos dos mercados de consumo em crescimento
mais rápido no mundo.
O mercado chinês de pagamentos digitais, de longe o maior do
mundo, é dominado pelo Alibaba Group Holding, gigante de comércio eletrônico, e
pela companhia de mídia social Tencent Holdings. Agora, ambas estão
injetando dinheiro e know-how em startups de dinheiro móvel em outros
mercados asiáticos, da Indonésia à Índia.
As pessoas em toda a Ásia estão migrando do dinheiro para aplicativos de
smartphones ao comprar bens e transferir dinheiro entre indivíduos, mas as
empresas americanas “ainda estão muito focadas em seu mercado doméstico”,
tentando ampliar o uso nos EUA, disse Shiv Putcha, analista da empresa de
pesquisa IDC, em Mumbai.
Na China, os códigos QR são amplamente usados pelos donos de smartphones para
pagar contas e fazer compras em lojas e em máquinas de venda, tendo contribuído
para um mercado de US$ 9 trilhões de pagamentos móveis em 2016, segundo a
iResearch. Isso é quase 90 vezes o tamanho do mercado de pagamentos móveis dos
EUA, de US$ 112 bilhões, de acordo com dados da Forrester.
Duas plataformas de pagamentos — o Alipay e o Tenpay, do Alibaba, são
responsáveis por aproximadamente 90% dos pagamentos, em valor de transações via
internet, na China, diz a iResearch. À medida que o mercado chinês amadurece,
Alibaba e Tencent passam a focar a expansão para o exterior, ajudando startups
locais em mercados emergentes a operar sistemas de dinheiro móvel que não
necessitam cartões plásticos.
Investidores chineses proveram a maior parte do financiamento de US$ 2,7
bilhões para startups asíáticas de tecnologia financeira no segundo trimestre
deste ano, segundo a CB Insights. Sua experiência na China e know-how técnico
pode ser ainda mais valioso.
Como na China, comerciantes em muitos países emergentes não possuem máquinas
de ponto de venda necessárias para processar pagamentos por meio do Apple Pay,
da Apple, e do Android Pay, da Alphabet. Por outro lado, poucos consumidores
nesses mercados possuem cartões de crédito ou de débito para fazer
pagamentos.
O Paytm, maior aplicativo de pagamentos móveis na Índia, se inspira no
Alibaba, um de seus principais financiadores. O diretor financeiro da Paytm,
Madhur Deora, disse que sua empresa se beneficia de reuniões frequentes com
executivos do Alibaba. “Nós trocamos ideias sobre design e produtos” e como os
serviços podem aumentar o envolvimento dos usuários, disse Deora. É
incalculável, segundo ele, o valor proporcionado pelo apoio de um parceiro que
sabe que se um novo recurso decolar, “você poderá ter 100 milhões de
usuários”.
Quando o governo da Índia, no ano passado, retirou 86% da moeda em circulação
para reprimir a corrupção e a evasão tributária, a Paytm entrou em ação. A
empresa inundou os varejistas indianos – a grande maioria dos quais não aceita
cartão de crédito porque não possuir a máquina de leitura – com adesivos
estampando o logotipo Paytm e códigos QR. O número de usuários do serviço
disparou.
Agora, a Paytm é usada na Índia para pagar artigos comprados de ambulantes,
deslocamentos em riquixás e muito mais. Os vendedores não precisam de outro
dispositivos além do código QR, que transfere dinheiro da conta móvel do
comprador para o vendedor.
A Paytm ganhou poder financeiro, em maio de 2017, ao captar US$ 1,4 bilhão do
SoftBank Group Corp, do Japão.
O Google, da Alphabet, lançou na semana passada seu próprio aplicativo de
pagamentos móveis via smartphones na Índia, que as pessoas podem usar para
transferir dinheiro para outras pessoas e empresas sem ter de usar um cartão de
crédito ou débito. Enquanto isso, o Alibaba e sua afiliada Ant Financial
investiram na Ascend Money, uma empresa de serviços financeiros na
Tailândia.
Os reis de pagamento digital da China têm outro incentivo para expandir:
turistas internacionais chineses, um grupo de consumidores que cresce
rapidamente. A Alibaba e a Tencent querem incorporar links a suas plataformas de
pagamento móvel para assegurar que seus serviços estejam disponíveis aos
consumidores chineses em qualquer local para onde viajem.
A Ant Financial firmou uma parceria com o grupo de mídia indonésio Emtek para
lançar um serviço de pagamentos digitais nesse país e com uma empresa de
tecnologia financeira nas Filipinas.
Em 2016, a Tencent promoveu uma rodada de captação de fundos de US$ 175
milhões a serem injetados na Hike, um aplicativo indiano de mensagens. Em junho,
a Hike incorporou um recurso de pagamentos em sua plataforma, superando
concorrentes maiores.
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