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Os recursos do petróleo deveriam ir para os brasileiros, para todos os estados brasileiros


Por Luis Roberto Ponte - Deputado constituinte de 1988 (texto originalmente publicado no jornal Zero Hora de Porto Alegre)

Entre as ignomínias das relações federativas do Brasil, a distribuição dos royalties do petróleo extraído no mar é das mais escabrosas. Imagine que um pai de família com 27 filhos, tendo ganho uma fortuna na loteria, decida entregar 90% dessa riqueza a apenas três dos filhos pela única razão de que a casa lotérica onde fez a aposta está na frente das residências desses três privilegiados, mesmo sabendo que um deles é o mais bonito e um dos mais ricos, que outro é o mais rico e orgulhoso, que o terceiro está muito bem de vida, enquanto muitos dos demais 24 filhos passam sérias dificuldades econômicas.

Pois a estapafúrdia injustiça que tal pai faria seguindo esse tresloucado critério é rigorosamente a mesma coisa que a União faz com a distribuição dos royalties do petróleo entre Estados e municípios usando o critério de distribuí-los quase exclusivamente apenas para os três Estados cujo litoral está mais próximo do local do mar, que é da União, de onde se extrai o petróleo e que fica a mais de 300 quilômetros desse litoral.

Por que, então, tal aberração é aceita e defendida por economistas, políticos, formadores de opinião, e não causa extrema indignação à mídia e à população brasileira atingida por essa iniquidade?

É que os privilegiados embasam sua defesa em três deslavadas mentiras, repetidas à exaustão, ao ponto de confundir até a Presidência da República, que acabou vetando o dispositivo que corrige parcialmente essa insensatez usando essas mentiras na sua justificação, quais sejam: 1) essa riqueza pertence aos Estados produtores, como previsto na Constituição; 2) esses recursos destinam-se a compensar os Estados por despesas que arcarão para proteger o meio ambiente e preparar sua infraestrutura para receber os novos investimentos que virão, e 3) qualquer mudança de critério de distribuição seria uma ilegal e inconstitucional quebra de contrato.

A verdade é rigorosamente o oposto: 1) não há Estado produtor, posto que o petróleo é extraído no mar, que pertence exclusivamente à União, vale dizer, a todos os Estados que a compõem, não podendo um Estado autodenominar-se produtor só porque seu litoral está menos distante de um poço que está fora do seu território, não falando a Constituição nesse insensato privilégio; 2) possíveis danos ambientais são mais prováveis que se deem nos Estados vizinhos, por causa das correntes marítimas, e se acontecerem serão reparados pela empresa que extrai o petróleo ou pela União, dona do mar. Quanto à necessidade desses recursos para o Estado menos distante garantir a infraestrutura necessária para receber os investimentos que virão para ele, é uma alegação risível. 

Qualquer Estado pagaria fortunas para ter este encargo altamente gerador de empregos, impostos e riqueza; 3) os contratos para pagamento dos royalties são celebrados entre a concessionária e o poder concedente, que é a União, e nada têm a ver, nem se alteram, com a forma como ela reparte esses recursos entre Estados e municípios, o que é determinado pela absurda lei atual que se quer corrigir, e que pode ser modificada, sem alterar qualquer contrato, sempre que a União entender mais justo.

A solução justa, e sem trauma, foi oferecida pelo Congresso e nunca aceita pelos Estados privilegiados: mudar a distribuição dos royalties usando um critério justo, por exemplo, distribuindo-os na proporção das populações dos Estados e municípios, e assegurando, em um período de transição, aos Estados atualmente privilegiados, a mesma arrecadação que tiveram no último ano, para poderem adaptar-se, sem trauma, às futuras perdas de arrecadação que ocorrerão com a retirada dos seus atuais privilégios pela nova lei que implantar a justiça dessa distribuição.

A presidente introduziu um fato novo, muito aplaudido pela opinião pública, que é a destinação dos royalties exclusivamente para educação. Com isso, ela angariou apoio ao injusto veto, misturando a injustiça da partição com a correção da sua destinação. Uma coisa nada tem a ver com a outra, e não se pode aceitar o escárnio da injustiça da partilha atual em nome da justeza da sua destinação.

As mentiras não deixaram fazer justiça. Talvez só reste a derrubada do veto para corrigir, ainda que não totalmente, essa absurda iniquidade, e o Congresso, se não se apequenar, o derrubará, desmascarando as mentiras e cumprindo o seu papel de promover a justiça entre os entes federados que representa. A presidente, mulher justa, corajosa e digna, aceitará isso serenamente, quando perceber as mentiras que a induziram ao injusto
veto.

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